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domingo, 25 de setembro de 2011

O PANTOCRATOR "AQUELE QUE TUDO REGE".



Ele é, ao mesmo tempo, o Filho de Deus humanado e o Deus que reina que tudo rege o Pantocrator. Ele é pintado ao mesmo tempo severo e manso. De toda sua pessoa transpira a fragrância de perfume espiritual. De sua cabeça imaculada e da sua cabeleira se desprende uma refinada grandeza; dos seus olhos, amor e serenidade, aquele de quem “percuta” os corações e os rins; do seu nariz equidade e misericórdia; da sua boca; paz e perdão; das suas faces, clemência e bondade; do seu pescoço e dos ombros, misericórdia e piedade; da sua mão direita, bênção e indulgência; da esquerda, que segura com força o santo Evangelho, se origina a Lei vivificante que conforta os abatidos; o seu queixo redondo manifesta doçura e longanimidade. Da sua boca emana o óleo da santidade; do manto que o envolve, como a nuvem ao sol, se efunde a imensidade do todo.
O Pantocrator infunde na alma devota todos os santos sentimentos, sendo ele, grande, poderoso, criador, onividente, suave, amigo dos homens, salvador, juiz, humilde, severo, misericordioso. Ele é, segundo a palavra de Ezequiel, a “Águia” grande de grandes asas, que voa eternamente e incorrupta sobre o mundo. Para ele “mil anos são como o dia de ontem que passou”.
As imagens do Pantocrator guardam algo da humanidade amável do Salvador, que acariciava crianças e dizia de si mesmo se “manso e humilde de coração”. O mais antigo ícone do Pantocrator encontra-se no Mosteiro de Santa Catarina no Monte Sinai, talvez na época de Justiniano I (VI século), que Heinrich Pfeiffer considera a “base de toda imagem do Cristo Pantocrátor”, possuem expressão bastante suave que inspira mais veneração do que temor. Os artistas pareciam, então, preocupados em sugerir algo não visível, a transcendência divina.
“Quando ouvimos o termo Pantocrator, Aquele que tudo rege, compreendemos com a mente de Deus mantêm no ser todas as coisas: tanto as de natureza inteligível como as de natureza material. Por isso ele contém o universo e as mãos os confins da terra; avalia os céus com o palmo (Isaías 40,12); por isso ele mede o mar com a mão; e também, por isso abrange em si todas as criaturas inteligíveis, a fim de que todas as coisas permaneçam no ser, contidas por meio do poder que tudo abraça.
A intenção dos artistas bizantinos era acentuar, visualmente, quatro realidades:
- O fato de que Deus domina todas as criações;
- o fato de que Deus conserva tudo no ser;
- o fato de que Deus abrange e contém tudo em si;
- o fato de que Deus penetra todas as coisas.
A necessidade de se projetar a figura de Cristo na esfera do sobrenatural tenha levado artistas bizantinos a se servirem de uma série de recursos estilísticos. Mencionemos os principais: a idealização da figura, que apresenta feições, não realistas nem individuais; o alongamento do corpo (quando a representação é de corpo inteiro); a supressão de espaço real, uma vez que o ambiente e a paisagem são reduzidos a indicações; a supressão do movimento, que confere às imagens uma imobilidade hierática; os fundos de ouro[1], que contribuem para que a imagem se situe numa sorte de infinitos, a rigorosa frontalidade dos semblantes, que com seus olhos desmesurados sugerem a vida que não esta mais ao alcance da morte; e, finalmente, a desmaterialização do suporte mediante um habilidoso uso da cor e da luz. Ou seja, a cor é utilizada sem referencia aos objetos concretos, o que torna a arte bizantina precursora do abstracionismo. Wassily Kandinsky, “pai da Arte Abstrata” declarou que o contato com os ícones russos medievais (cuja fonte de inspiração foi a arte bizantina) “influenciou todo o seu desenvolvimento artístico.
            A teologia bizantina sempre quis ver na figura do “Senhor de Todas as Coisas” uma profissão de fé na divindade de Cristo. Sendo a iconografia não uma arte válida em si mesma, mas uma arte para a Igreja lhe incumbido expressar o conteúdo da crença e da prática dos fiéis. Eis por que o lugar o Pantocrátor é sob a cúpula central, onde as abóbadas se cruzam. A cúpula representa o céu. Ademais, a figura do “Senhor vestido de louvor e magnificência” evoca três outros atributos: a grandeza do Criador, a bondade ativa do Salvador, e a austeridade do Juiz imparcial. Toda a leitura das imagens do Pantocrator é obrigada a privilegiar tal dimensão telógico-liturgico. A arte bizantina permaneceu sempre ancorada na preocupação trinitária, uma vez que este é o “mistério primordial da revelação”. Vladimir Lossky nota: “A teologia mística da Igreja Oriental sempre se afirmará como triadocêntrica. O conhecimento de Deus será (para ela) um conhecimento da Trindade. Tal preocupação levou o monge pintor Andrei Rublev (1330-1430), beatificado por ocasião do Primeiro Milênio da Evangelização da Rússia (988-1988) a criar um dos mais assombrosos ícones da tradição russa, o Ícone da Trindade (1411; hoje na Galeria Tretiakov, em Moscou). O Pantocrator é sempre visto na sua humanidade, mas em união substancial com a divindade, “esplendor comum das Três Pessoas”.



[1] A influência da estética de Dionísio Aeropagita sobre a arte bizantina manifesta-se no emprego do ouro. Segundo Dionísio, o ouro faz aparecer um esplendor indestrutível, pródigo, inesgotável e imaculado. O ouro é o reflexo do sol. O ouro é mais irradiação e brilho do que cor. Por isso o ouro se encontra em toda a parte onde se quer expressar a participação na vida divina, sobretudo nas auréolas, vestimentas sagradas, vasos rituais e evangeliários. As próprias vestes de Cristo são freqüentemente, ornadas com filigranas douradas, símbolo de sua divindade.

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